Frege, Gottlob (1848 - 1945)
Trabalhando na fronteira entre a filosofia e a matemática, Frege foi o principal criador da lógica matemáticamoderna, sendo considerado, ao lado de Aristóteles, o maior lógico de todos os tempos.
Estudou nas universidades de Jena e Gotinga e tornou-se professor de Matemática em Jena, onde lecionou primeiro como docente e, a partir de 1896, como catedrático, onde permaneceu até sua morte. Em 1879publicou Begriffsschrift (1879). Ideografia (Ideography) é uma tradução sugerida em carta pelo próprio autor, outra opção seria Notação Conceptual), onde, pela primeira vez, se apresentava um sistema matemático lógico no sentido moderno.
Em parte incompreendido por seus contemporâneos, tanto filósofos como matemáticos, Frege prosseguiu seus estudos e publicou, em 1884, Die Grundlagen der Arithmetik (Os Fundamentos da Aritmética), obra-prima filosófica que, no entanto, sofreu uma demolidora crítica por parte de Georg Cantor, justamente um dos matemáticos cujas ideias se aproximavam mais das suas. Em 1903 publicou o segundo volume deGrundgesetze der Arithmetik (Leis básicas da Aritmética), em que expunha um sistema lógico no qual seu contemporâneo e admirador Bertrand Russell encontrou uma contradição, que ficou conhecida como oparadoxo de Russell. Esse episódio impactou profundamente a vida produtiva de Frege. Segundo Russell, apesar da natureza de suas descobertas marcarem época, sua obra permaneceu na obscuridade até 1903, quando o próprio filósofo e matemático inglês chamou atenção para a relevância dos escritos. O grande contributo de Frege para a lógica matemática foi a criação de um sistema de representação simbólica (Begriffsschrift, conceitografia ou ideografia) para representar formalmente a estrutura dos enunciados lógicos e suas relações, e a contribuição para a implementação do cálculo dos predicados. Esse parte da decomposição funcional da estrutura interna das frases (em parte substituindo a velha dicotomia sujeito-predicado, herdada da tradição lógica Aristotélica, pela oposição matemática função-argumento) e da articulação do conceito de quantificação (implícito na lógica clássica da generalidade), tornado assim possível a sua manipulação em regras de dedução formal. (As expressões "para todo o x", "existe um x", que denotam operações de quantificação sobre variáveis têm na obra de Frege uma de suas origens).
Ao contrário de Aristóteles, e mesmo de Boole, que procuravam identificar as formas válidas de argumento, e as assim chamadas "leis do pensamento", a preocupação básica de Frege era a sistematização do raciocínio matemático, ou dito de outra maneira, encontrar uma caracterização precisa do que é uma “demonstração matemática”. Frege havia notado que os matemáticos da época freqüentemente cometiam erros em suas demonstrações, supondo assim que certos teoremas estavam demonstrados, quando na verdade não estavam. Para corrigir isso, Frege procurou formalizar as regras de demonstração, iniciando com regras elementares, bem simples, sobre cuja aplicação não houvesse dúvidas. O resultado que revolucionou a lógica foi o desenvolvimento do cálculo de predicados (ou lógica de predicados).
Filósofo
Frege é um dos fundadores da filosofia analítica , principalmente por causa de suas contribuições à filosofia da linguagem , incluindo a
- Função -argumento análise da proposição ;
- Distinção entre conceito e objeto (Begriff und Gegenstand);
- Princípio da composicionalidade ;
- Princípio do contexto ;
- Distinção entre o sentido e referência (Sinn und Bedeutung) de nomes e outras expressões, dito às vezes envolvem uma teoria de referência mediada .
Deve ser mantido em mente que Frege foi empregado como um matemático, e não um filósofo, e publicou seus artigos filosóficos em revistas acadêmicas que muitas vezes eram de difícil acesso fora do mundo de língua alemã. Suas primeiras coleções de seus escritos apareceram apenas após a Segunda Guerra Mundial . Um volume de traduções em Inglês dos ensaios filosóficos de Frege aparecereu pela primeira vez em 1952, editado por alunos de Wittgenstein, Peter Geach (nascido em 1916) e Preto Max (1909-1988), com o apoio bibliográfico de Wittgenstein (ver Geach, ed. 1975 Introdução, ). Apesar dos elogios generosos de Russell e Wittgenstein, Frege era pouco conhecido como filósofo durante sua vida. Suas ideias expandiram-se principalmente por aqueles que ele influenciou, como Russell, Wittgenstein e Carnap, e através do trabalho na lógica e semântica pelos lógicos poloneses.
Habermas, Jürgen (1929 - ?) é um filósofo e sociólogo alemão, inserido na tradição da teoria crítica e do pragmatismo. É conhecido por suas teorias sobre a racionalidade comunicativa e aesfera pública,1 sendo considerado como um dos mais importantes intelectuais contemporâneos.2
Associado com a Escola de Frankfurt, o trabalho de Habermas trata dos fundamentos da teoria social e daepistemologia, da análise da democracia nas sociedades sob o capitalismo avançado, do Estado de direitoem um contexto de evolução social (no qual a racionalização do mundo da vida ocorre mediante uma progressiva libertação do potencial de racionalidade contido na ação comunicativa de modo que a ação orientada para o entendimento mútuo ganha cada vez mais independência dos contextos normativos)3 e da política contemporânea, particularmente na Alemanha.
Em seu sistema teórico, Habermas procura revelar as possibilidades da razão, da emancipação e dacomunicação racional-crítica, latentes nas instituições modernas e na capacidade humana de deliberar e agir em função de interesses racionais.
Habermas é conhecido por seu trabalho sobre a modernidade e particularmente sobre a racionalização, nos termos originalmente propostos por Max Weber.4 O pensamento de Habermas também tem sido influenciado pelo pragmatismo americano, pela teoria da ação e mesmo pelo pós-estruturalismo.
Pensamento
Em geral considerado como o principal herdeiro das discussões da Escola de Frankfurt, uma das principais correntes do Marxismo cultural, Habermas procurou, no entanto, superar o pessimismo dos fundadores da Escola, quanto às possibilidades de realização do projeto moderno, tal como formulado pelos iluministas. Profundamente marcados pelo desastre da Segunda Guerra Mundial, Adorno e Horkheimer consideravam que houvesse um vínculo primordial entre conhecimento racional e dominação, o que teria determinado a falência dos ideais modernos de emancipação social.
Para recolocar o potencial emancipatório da razão, Habermas adota o paradigma comunicacional. O seu ponto de partida é a ética comunicativa de Karl Otto Apel5 6 , além do conceito de "razão objectiva" de Adorno, também presente em Platão, Aristóteles e no Idealismo alemão - particularmente na ideiahegeliana de reconhecimento intersubjectivo.
Assim, Habermas concebe a razão comunicativa - e a acção comunicativa ou seja, a comunicação livre, racional e crítica - como alternativa à razão instrumental e superação da razão iluminista - "aprisionada" pela lógica instrumental, que encobre a dominação. Ao pretender a recuperação do conteúdo emancipatório do projecto moderno, no fundo, Habermas está preocupado com o restabelecimento dos vínculos entre socialismo e democracia.
Segundo o autor, duas esferas coexistem na sociedade: o sistema e o mundo da vida. O sistema refere-se à 'reprodução material', regida pela lógica instrumental (adequação de meios a fins), incorporada nas relações hierárquicas (poder político) e de intercâmbio (economia).
O mundo da vida é a esfera de 'reprodução simbólica', da linguagem, das redes de significados que compõem determinada visão de mundo, sejam eles referentes aos fatos objectivos, às normas sociais ou aos conteúdos subjectivos.
É conhecido o diagnóstico habermasiano da colonização do mundo da vida pelo sistema e a crescente instrumentalização desencadeada pela modernidade, sobretudo com o surgimento do direito positivo, que reserva o debate normativo aos técnicos e especialistas. Contudo, desde a década de 1990, mudou sua perspectiva acerca do direito, considerando-o mediador entre o mundo da vida e o sistema.
Na acção comunicativa ocorre a coordenação de planos de dois ou mais actores via assentimento a definições tácitas de situação. Tem-se não raro uma visão reducionista deste conceito, entendido como mero diálogo. Mas de facto a acção comunicativa pressupõe uma teoria social - a do mundo da vida - e contrapõe-se à acção estratégica, regida pela lógica da dominação, na qual os actores coordenam seus planos no intuito influenciar, não envolvendo assentimento ou dissentimento. Habermas define sinteticamente a acção estratégica como "cálculo egocêntrico".
Seus estudos voltam-se para o conhecimento e a ética. Sua tese para explicar a produção de saber humano recorre ao evolucionismo, pois a racionalidade comunicativa é considerada 'aprendente'. Segundo Habermas, a falibilidade possibilita desenvolver capacidades mais complexas de conhecer a realidade, além de representar garantia contra regressões metafísicas, com possíveis desdobramentos autoritários. Evolui-se assim através dos erros, entendidos como falhas de coordenação de planos de acção.
Habermas defende também uma ética universalista, deontológica, formalista e cognitivista. Para ele, os princípios éticos não devem ter conteúdo, mas garantir a participação dos interessados nas decisões públicas através de discussões (discursos), em que se avaliam os conteúdos normativos demandados naturalmente pelo mundo da vida.
Sobre sua teoria discursiva, aplicada também à filosofia jurídica, pode ser considerada em prol da integração social e, como consequência, da democracia e dacidadania. Tal teoria coloca a possibilidade de resolução dos conflitos vigentes na sociedade não com uma simples solução, mas a melhor solução - aquela que resulta do consenso de todos os concernidos.
Sua maior relevância está, indubitavelmente, em pretender o fim da arbitrariedade e da coerção nas questões que circundam toda a comunidade, propondo uma participação mais activa e igualitária de todos os cidadãos nos litígios que os envolvem e, concomitantemente, obter a tão almejada justiça. Essa forma defendida por Habermas é o agir comunicativo que se ramifica no discurso.
Do Agir Estratégico para o Agir Comunicativo
Na orientação para o sucesso, o individuo persegue os seus interesses individuais, organizando uma estratégia baseada nas conseqüências de suas ações. Para alcançar seus objetivos, vale influenciar outros indivíduos, por meio de armas, bens, ameaças e seduções. E em qualquer eventual cooperação, cada indivíduo só está interessado no que pode ganhar individualmente com isso. Chamaremos esse tipo de ação de “ação estratégica”.
Habermas defende, como proposta para a sociedade, que transitemos progressivamente da ação estratégica para a ação comunicativa. Nesse tipo de ação, a orientação deixa de ser exclusivamente para o sucesso individual, e passa a se denominar como orientação para o entendimento mútuo. Nesse novo âmbito, os atores procuram harmonizar seus interesses e planos de ação, através de um processo de discussão, buscando um consenso. Nota-se que, embora os dois tipos de orientação possuam a marca da racionalidade humana, a grande diferença é que, na ação estratégica a definição da finalidade não abre espaço para ouvir os argumentos dos outros, enquanto no agir comunicativo há um espaço de diálogo, em que se pensa em conjunto sobre quais devem ser os melhores objetivos a serem buscados por um grupo social. O entendimento mútuo, provindo do agir comunicativo, será um importante facilitador da coordenação de ações, e servirá de base para a defesa da democracia no cenário político, com a crítica da repressão, censura e de outras medidas que não propiciam o diálogo dentro da sociedade.
Hegel, Friedrich (1770-1831)
Hegel (1770-1831) foi um filósofo alemão. Um dos criadores do sistema filosófico chamado idealismo absoluto, influenciou teóricos com Marx e Kant.
Hegel nasceu em Stuttgart, Alemanha. Estudou no seminário de Tubinga com o poeta Holderlin e o filósofo Schelling. Foi professor de latim em Nuremberg e ocupou a cátedra na Universidade de Heidelberg. Foi também professor da Universidade de Humcorsvick onde lecionou filosofia.
O sistema desenvolvido por Hegel, o idealismo absoluto, abrangeu várias áreas do conhecimento como a política, a psicologia, a arte, a filosofia e a religião. A teoria do filósofo baseia-se na ideia de que as contradições e dialéticas são resolvidas para a criação de um modelo, que tanto pode refletir-se no espírito - sentido de alma e aspirações ideais, como no Estado político.
A época de Hegel é importante para analisar a sua filosofia. Ele vivia numa Alemanha dividida em territórios independentes, cada qual, com aparato jurídico e militar próprio. Isso Foi relevante para que Hegel desse ao Estado um papel tão importante, a mais alta realização do espírito absoluto.
Sua obra possui grande influência no ocidente, tendo Marx e Kant como exemplos evidentes disso. Seu livro “Fenomenologia do Espírito” (1806) foi a sua obra maior. O livro refletia as etapas da consciência que apreende o mundo e encontra a si mesmo para chegar finalmente à totalidade e ao absoluto. O pensamento hegeliano foi crucial para o desenvolvimento das teorias de Karl Marx, embora este usasse o método dialético de Hegel em bases materialistas e econômicas.
Obra
A primeira e a mais importante das obras maiores de Hegel é sua Fenomenologia do Espírito. Em vida, Hegel ainda viu publicada a Enciclopédia das Ciências Filosóficas, a Ciência da Lógica, e os Princípios (Elementos da) Filosofia do Direito. Várias outras obras sobre filosofia da história, religião, estética e história da filosofia foram compiladas a partir de anotações feitas por seus estudantes, tendo sido publicadas postumamente.
Teoria
Filósofo da totalidade, do saber absoluto, do fim da história, da dedução de toda a realidade a partir do conceito, da identidade que não concebe espaço para o contingente, para a diferença; filósofo do estado prussiano, que hipostasiou o Estado - todas essas são algumas das recepções da filosofia de Hegel na contemporaneidade. É difícil dizer até que ponto essas qualificações são justas para com a filosofia hegeliana.
Ademais, as obras de Hegel possuem a fama de serem difíceis, devido à amplitude dos temas que pretendem abarcar. Diz a anedota (possivelmente verdadeira) que, quando saiu a tradução francesa da Fenomenologia do Espírito, muitos estudiosos alemães foram tentar estudar a Fenomenologia pela tradução francesa, para "ver se entendiam melhor" o árido texto hegeliano.(A) O fato é que sua filosofia é realmente difícil, embora isso não se deva necessariamente a uma confusão na escrita. Afinal, Hegel era crítico das filosofias claras e distintas, uma vez que, para ele, o negativo era constitutivo daontologia. Neste sentido, a clareza não seria adequada para conceituar o objeto. Introduziu um sistema para compreender a história da filosofia e do mundomesmo, chamado geralmente dialética: uma progressão na qual cada movimento sucessivo surge como solução das contradições inerentes ao movimento anterior.
Gonçal Mayos examina a evolução da dialética da periodização da história:4 Hegel mudou o seu ideal grego juvenil e, gradualmente, vê a realização do princípio da reconciliação não mais na Revolução francesa, mas na Reforma protestante. A Revolução Francesa, precisamente por sua novidade absoluta, é também absolutamente radical: por um lado, o aumento abrupto da violência que fez falta para realizar a revolução, não pode deixar de ser o que é, e, por outro lado, já consumiu seu oponente. A revolução, por conseguinte, já não pode voltar-se para nada além de seu resultado: a liberdade conquistada com tantas penúrias é consumida por um brutal Reinado do Terror. A história, não obstante, progride aprendendo com seus erros: somente depois desta experiência, e precisamente por causa dela, pode-se postular a existência de um Estado constitucional de cidadãos livres, que consagra tanto o poder organizador benévolo (supostamente) do governo racional e os ideais revolucionários da liberdade e da igualdade.
Segundo Umberto Padovani e Luis Castagnola, em "A história da Filosofia": "A Lógica tradicional afirma que o ser é idêntico a si mesmo e exclui o seu oposto (principio da identidade e de contradição); ao passo que a lógica hegeliana sustenta que a realidade é essencialmente mudança, devir, passagem de um elemento ao seu oposto."
De todo modo, a dialética é uma das muitas partes do sistema hegeliano que foi objeto de má compreensão ao longo do tempo. Possivelmente, uma das razões para isto é que, para Hegel, é preciso abandonar a ideia de que a contradição produz um objeto vazio de conteúdo. Ou seja, Hegel dá dignidade ontológica à contradição, bem como ao negativo. Por outro lado, Hegel não queria com isso dizer que absurdos como, por exemplo, pensar que um quadrado redondo fosse possível. Talvez um melhor exemplo da dignidade ontológica da contradição é pensarmos nos conceitos aristotélicos de potência e ato (um ser que é ao mesmo tempo potência e ato) ou então na concepção dos objetos como unos e múltiplos ao mesmo tempo.
Nas explicações contemporâneas do hegelianismo - para os estudantes universitários, por exemplo - a dialética de Hegel geralmente aparece fragmentada, por comodismo, em três momentos chamados: tese (em nosso exemplo, a revolução), antítese (o terror subsequente) e a síntese (o estado constitucional de cidadãos livres). No entanto, Hegel não empregou pessoalmente essa classificação absolutamente; ela foi criada anteriormente por Fichte em sua explicação mais ou menos análoga à relação entre o indivíduo e o mundo. Os estudiosos sérios de Hegel não reconhecem, em geral, a validade desta classificação, ainda que possivelmente tenha algum valor pedagógico.
Hegel utilizou-se deste sistema para explicar toda a história da filosofia, da ciência, da arte, da política e da religião, mas muitos críticos modernos assinalam que Hegel geralmente parece analisar superficialmente as realidades da história a fim de encaixá-las em seu modelo dialético. Karl Popper, crítico de Hegel emA Sociedade Aberta e Seus Inimigos, opina que o sistema de Hegel constitui uma justificação velada do governo de Frederico Guilherme III e da ideia de que o objetivo ulterior da história é chegar a um Estado semelhante à Prússia dos anos 1830. Esta visão de Hegel como apologista do poder estatal e precursor dototalitarismo do século XX foi criticada minuciosamente por Herbert Marcuse em Razão e Revolução: Hegel e o surgimento da teoria social. Segundo Marcuse, Hegel não fez apologia a nenhum Estado ou forma de autoridade, simplesmente porque existia: para Hegel, o Estado tem que ser sempre racional. Já Arthur Schopenhauer desprezou Hegel por seu historicismo e tachou a obra de Hegel de pseudo-filosofia.
Como se vê, a obra hegeliana é fonte de inúmeras controvérsias, mas, sem dúvida, a filosofia, na maior parte dos casos, não deixa de se referir a Hegel - mesmo quando é anti-hegeliana. Por outro lado, várias vertentes filosóficas inserem-se no legado hegeliano - embora em geral não se autointitulem hegelianas - a exemplo do Pragmatismo, da Escola de Frankfurt e do Marxismo.
Pensamento
As obras de Hegel têm fama de difíceis graças à amplitude dos temas que pretendem abarcar. Hegel introduziu um sistema para entender a história da filosofia e o próprio mundo, chamado amiúde de "dialética": uma progressão na qual cada movimento sucessivo surge como solução das contradições inerentes ao movimento anterior. Por exemplo, a Revolução Francesa constitui, para Hegel, pela primeira vez na história, a introdução da verdadeira liberdade nas sociedades ocidentais.
Entretanto, precisamente por sua novidade absoluta, é também absolutamente radical: por um lado, o aumento abrupto da violência – que fez falta para realizar a revolução – não pode deixar de ser o que é; e, por outro lado, já consumiu seu oponente. A revolução, por conseguinte, já não tem mais para onde volver-se além de seu próprio resultado: a liberdade conquistada com tantas penúrias é consumida por um brutal Reinado de Terror. A história, não obstante, progride aprendendo com seus próprios erros: somente depois desta experiência, e precisamente por ela, pode se postular a existência de um Estado constitucional de cidadãos livres, que consagra tanto o poder organizador benévolo (supostamente) do governo racional e os ideais revolucionários da liberdade e da igualdade. "A liberdade reside no pensamento".
Nas explicações contemporâneas do hegelianismo – para as classes pré-universitárias, por exemplo –, a dialética de Hegel frequentemente aparece fragmentada, por comodidade, em três momentos, chamados: tese (em nosso exemplo, a revolução), antítese (o terror subsequente) e síntese (o estado constitucional de cidadãos livres). Contudo, Hegel não empregou pessoalmente esta classificação em absoluto; na verdade, ela foi criada anteriormente, por Fichte, em sua explicação mais ou menos análoga da relação entre o indivíduo e o mundo. Os estudiosos sérios de Hegel não reconhecem, genericamente, a validez desta classificação, conquanto provavelmente tenha algum valor pedagógico (vide: Tríade dialética).
O historicismo cresceu significativamente durante a filosofia de Hegel. Da mesma maneira que outros expoentes do historicismo, considerava que o estudo daHistória era o método adequado para abordar o estudo da ciência da sociedade, já que revelaria algumas tendências do desenvolvimento histórico. Em sua filosofia, a história não somente oferece a chave para a compreensão da sociedade e das mudanças sociais, como também é considerada tribunal de justiça do mundo.
A filosofia de Hegel afirmava que tudo o que é real, é também racional; e, por corolário, tudo o que é racional, é real. O fim da história era, para Hegel, a parusia do espírito; e o desenvolvimento histórico podia ser equiparado ao desenvolvimento de um organismo (os componentes têm funções definidas, sendo que enquanto trabalham, afetam o restante). Hegel acredita em uma norma divina, fulcrada no princípio de que em tudo se encontra a volição de Deus, a qual é conduzir o homem para a liberdade; porquanto é panteísta. Justifica, então, a desgraça histórica: todo o sangue e a dor, a pobreza e as guerras, constituem "o preço" necessário a ser pago para alcançar a liberdade da humanidade.
Hegel valeu-se deste sistema para explicar toda a história da filosofia, da ciência, da arte, da política e da religião; no entanto, muitos críticos modernos assinalam que Hegel constantemente parece ignorar as realidades da história a fim de fazê-las encaixar em seu molde dialético. Karl Popper, crítico de Hegel em A sociedade aberta e seus inimigos, opina que o sistema de Hegel constitui uma justificação vagamente dissimulada do governo de Frederico Guillermo III e da ideia hegeliana de que o objetivo ulterior da história é chegar a um Estado que se aproxima ao da Prússia do decênio de 1831. Esta visão de Hegel como apólogo do poder estatal e precursor do totalitarismo do século XX foi criticada minuciosamente por Herbert Marcuse em Razão e revolução: Hegel e o surgimento da teoria social, arguindo que Hegel não foi apólogo nem do Estado nem da forma de autoridade, simplesmente porque estes existiram; para Hegel, o Estado deve ser sempre racional. Arthur Schopenhauer desprezou Hegel por seu historicismo e tachou sua obra de pseudofilosofia.
A filosofia da história de Hegel está também marcada pelos conceitos da "astúcia da razão" e do "escárnio da história". A história conduz os homens que creem se conduzir de per si, como indivíduos e como sociedades, castigando suas pretensões, de modo que a história-mundo, ao fazer troça deles, produz resultados exatamente contrários e paradoxais aos pretendidos por seus autores, a despeito de, nos períodos finais, a história se reordenar e, em um cacho fantástico, retroceder sobre si mesma e, com sua gozação sarcástica e paradoxal convertida em mecanismo de criptografia, cria também ela mesma, sem querer, realidades e símbolos ocultos ao mundo e acessíveis tão-somente aos cognoscentes, id est, àqueles que querem conhecer.
Princípio fundamental
Tudo é inteligível para o ser que, idêntico no seu fundo com o Espírito ou a Ideia infinita, se manifesta no universo concreto graças ao movimento dialéctico: tese, antítese, síntese.
A intuição fundamental de Hegel, fiel ao panteísmo idealista, é que, no universo, todas as riquezas de fenómenos e de indivíduos concretos, com a humanidade e todos os acontecimentos da sua história, são apenas as manifestações necessárias, inteligíveis a priori, duma realidade única: o Espírito infinito que, sendo de ordem ideal, não pode conter elemento algum irracional ou inexplicável, de direito: "Todo o real, diz ele, é racional". A sua filosofia não foi senão um esforço para esclarecer até nos seus mínimos pormenores esta vista central.
Para isso, Hegel escolheu judiciosamente como ponto de partida o Ser, a noção mais simples e mais abstracta, luz inteligível que ilumina todas as outras ideias; e conforme o postulado panteísta quer mostrar que a lei fundamental deste ser, única realidade, o leva necessariamente a manifestar-se nos múltiplos objectos e fenómenos concretos tais como os verificam a nossa experiência e as nossas ciências positivas.
Aliás, não dá a esta dedução o sentido duma teogonia ou duma emanação real, como se pretendesse que "o mais sai do menos" e que "o abstracto engendra o concreto": quer simplesmente libertar a lei ideal que torna inteligível o universo concreto desenvolvido sob o nosso olhar, mostrando como cada um dos seus pormenores decorre inevitavelmente da única realidade subjacente às múltiplas aparências: o Espírito ou Ideia que é o ser absoluto (*). As noções muito gerais que constituem as primeiras fases da dedução têm pois a sua origem nos factos mais ricos e mais reais, como a ideia abstracta é tirada do concreto; e é preciso distinguir duas séries; uma ideal, descrita em filosofia, a outra, real, verificada nas ciências positivas. Notemos, contudo, que o idealismo torna precária e pouco inteligível esta distinção; porque afirma a coincidência entre a ideia e a realidade. "Tudo o que é racional é real", diz ainda Hegel. Mas, a seu parecer, basta para isso que a correspondência perfeita entre o sistema a priori e a experiência se verifique no termo da dedução, sem exigir, em todas as fases, um paralelismo total entre as ideias e os factos.
Ora a lei cujo desenvolvimento necessário engendra todo o universo é a da dialéctica, segundo a qual toda ideia abstracta, a começar pela de ser, considerada no seu estado de abstracção, afirma necessariamente a sua negação, a sua antítese, de modo que esta contradição exige para se resolver a afirmação de uma síntese mais compreensiva que constitui uma nova ideia, rica, ao mesmo tempo, do conteúdo das duas outras. Esta marcha para diante, segundo Hegel, não é arbitrária; está inserida na própria essência da noção abstracta bem analisada; e enquanto a ideia sintética assim obtida guardar um lado abstracto, manifesta à reflexão uma nova identidade com o seu contrário, uma nova exigência de progresso, até que enfim a última síntese exprime o facto de experiência concreto, único a existir realmente. Trata-se pois, para o filósofo, de abranger num só olhar o imenso desenvolvimento das realidades concretas que formam o universo, de remontar daí, por mil caminhos diversos mas convergentes, através das fases cada vez mais abstractas até a origem comum do ser ou do Espírito absoluto; e, terminada esta análise preliminar, o sistema consiste em tomarmos posse do desenvolvimento a priori destas cascatas de noções caindo umas das outras por trilogias, com uma necessidade lógica tão rigorosa como a dedução dos modos em Spinozismo. Hegel teve a audácia de tentar esta síntese, depois de se ter abundantemente documentado sobre o estado de todas as ciências positivas do seu tempo cujo conteúdo experimental devia ser incorporado no seu sistema; e concebeu este num sentido evolucionista, graças ao método dialéctico.
Esta "dialéctica" bem compreendida não parece ser, como se disse, a negação do princípio de contradição; é, pelo contrário, esforço para escapar à contradição passando à noção sintética que reconcilia a tese com a antítese; mas, nestas fases preliminares, Hegel é de opinião que o nosso espírito pensa verdadeiramente a contradição; e tal é bem o caso, efectivamente de toda ideia abstracta, se a interpretarmos segundo o idealismo absoluto.
Para o mostrar, tomemos o exemplo da primeira trilogia da qual todas as outras são apenas uma aplicação; a do ser, a do não-ser e a do devir. O ser puramente abstracto, que não é senão ser, sem qualquer precisão, nem qualidade nem relação, não é mais que a forma vazia da afirmação. É "aquilo por que" tudo o que é real é real; mas em si mesmo nada é pois que se identifica ao mesmo tempo com realidades que se excluem: o círculo é ser e o quadrado também; o branco e o negro são ser; a árvore viva é ser e a pedra inerte também; e o ser é o que constitui, ao mesmo tempo, a realidade de cada um deles. Como a matéria-prima não é acto algum, mas sim potência pura, porque pode tornar-se todas as coisas corporais, assim o ser não é ser algum, porque pode tornar-se todos os seres. Pensá-lo é pensar, ao mesmo tempo, o nada absoluto: a própria contradição.
"Em tomismo, escapa-se a esta contradição notando que a natureza pensada, conquanto ficando a mesma em si, se encontra em dois estados diferentes e opostos: no estado de natureza concreta no real individual, por exemplo, a natureza animal neste cão; - e no estado de natureza abstracta na ideia universal, por exemplo, no conceito de animalidade. Assim, a natureza de ser, ficando o que é (notando que aqui o conteúdo da ideia é uma natureza abstracta imperfeitamente que se realiza dum modo análogo somente nos seus inferiores, e não univocamente, como a natureza animal), esta natureza pode identificar-se efectivamente com os modos de ser os mais diversos e os mais exclusivos e isso ao mesmo tempo e sem contradição, porque de si ela é indiferente: indiferente, por exemplo, ao infinito e ao finito, à vida e à morte; para ser não é necessário ter a vida nem excluí-la, mas pode exigir-se (se se é árvore, por exemplo) ou excluí-la (se se é pedra). O estado ideal ou abstracto desta natureza de ser, isto é, o que lhe convém como pensada por nós permite-lhe esta indiferença que não pode ter se a tomamos no seu estado real, no ser actualmente existente".
Mas estas distinções que definem a teoria do realismo moderado, tão conforme ao bom senso, perdem todo o valor em idealismo onde o real e o ideal são a mesma coisa. Se nesta hipótese tentamos pensar o ser abstracto, devemos necessariamente concebê-lo como idêntico realmente a objectos que se excluem, o que é a própria contradição. Contudo, o nosso pensamento não pode instalar-se na contradição: é psicologicamente impossível; por isso, pensar no ser, idêntico a tudo, é não pensar em nada: a tese arrasta a antítese e o ser muda-se em não-ser. Hegel conclui daqui que o que realmente é ser é uma síntese destas duas contraditórias. O que já é, sem ser ainda plenamente, é o que devém. O fundo do universo não é, pois, uma realidade estática, mas dinâmica; não é o ser, mas o devir que vai pôr ordem na multidão formigante dos modos de ser contraditórios, todos idênticos ao ser abstracto e que vai torná-los todos inteligíveis indicando o seu lugar no inflexível desenrolar das virtualidades do ser.
É a análise deste desenrolar que Hegel chama a "dedução das categorias (**) do ser"; cada uma das três fases da trilogia fundamental será fonte de numerosas aplicações, onde encontraremos todas as ciências humanas interpretadas segundo o idealismo absoluto e distribuídas em um triplo domínio: o dalógica, que é também uma ontologia; o da natureza; o da moral e da religião.
(**) Alusão à dedução transcendental das categorias de Kant; mas este não fizera este trabalho senão para as ciências positivas, enquanto Hegel quer fazê-lo para todo o saber humano: substitui o idealismo absoluto ao idealismo transcendental, mais moderado, de Kant.
[F.-J. Thonnard, A. A. Compêndio de História de Filosofia]
É um dos pensadores fundamentais do século XX - ao lado de Russell, Wittgenstein, Adorno, Popper eFoucault - quer pela recolocação do problema do ser e pela refundação da Ontologia, quer pela importância que atribui ao conhecimento da tradição filosófica e cultural. Influenciou muitos outros filósofos, dentre os quaisJean-Paul Sartre.
Filosofia
Heidegger considerava o seu método fenomenológico e hermenêutico. Ambos os conceitos referem a intenção de dirigir a atenção (a circunvisão) para o trazer à luz daquilo que na maior parte das vezes se oculta naquilo que se mostra, mas que é precisamente o que se manifesta nisso que se mostra. Assim, o trabalho hermenêutico visa interpretar o que se mostra pondo a lume isso que se manifesta aí mas que, no início e na maioria das vezes, não se deixa ver.
O método vai directamente ao fenómeno, procedendo à sua análise, pondo a claro o modo como da sua manifestação. Heidegger afirma que esta metodologia corresponde a um modelo kantiano, ou coperniciano da colocação ou projecção da perspectiva. Neste sentido, a sua metodologia operava uma inflexão do ponto de vista, na medida em que o foco deveria ser desviado do dasein para o ser. Esta inflexão focaliza os modos de ser do ente, correspondendo a uma inversão da ontologia tradicional.
Além da sua relação com a fenomenologia, a influência de Heidegger foi igualmente importante para oexistencialismo e desconstrucionismo.
Conceitos fundamentais
É habitual dividir a produção filosófica de Heidegger em duas partes, uma até ao final da década de vinte, outra a partir daí. Por vezes considera-se também uma terceira anterior à produção de O Conceito de Tempo (conferência proferida em 1924, mas publicada apenas em 1983, em Francês). Assim é comum falar-se do primeiro ou do segundo Heidegger, conforme se faz referência às suas produções anteriores ou posteriores ao seu livro Da essência da Verdade, escrito em 1930, embora a publicação seja de 1943. Gianni Vattimo fala de três momentos da filosofia de Heidegger (ver Introdução a Heidegger, Tradução João Gama, Instituto Piaget, 10ed., 1996)...
A divisão da filosofia de Heidegger em momentos não é pacífica. Há quem recuse a divisão, defendendo a continuidade do seu pensamento.
O ponto de partida do pensamento de Heidegger, principal representante alemão da filosofia existencial, é o problema do sentido do ser. Heidegger aborda a questão tomando como exemplo o ser humano, que se caracteriza precisamente por se interrogar a esse respeito. O homem está especialmente mediado por seu passado: o ser do homem é um "ser que caminha para a morte" e sua relação com o mundo concretiza-se a partir dos conceitos de preocupação, angústia, conhecimento e complexo de culpa. O homem deve tentar "saltar", fugindo de sua condição cotidiana para atingir seu verdadeiro "eu".
As bases de sua filosofia existencial foram expostas em 1928, na obra inacabada Ser e Tempo, 1927, publicada em Marburgo, que o tornou célebre fora dos meios universitários. Oriundo de uma família humilde, Heidegger pôde completar sua formação primária graças a uma bolsa eclesiástica, que lhe permitiu também iniciar estudos de teologia e de filosofia. Profundamente influenciado pelo estudioso de fenomenologia Edmund Husserl, de quem foi assistente após a Primeira Guerra Mundial (até 1923), começou então seus estudos no seio da corrente existencialista.
Embora sempre tenha vivido em Friburgo, exceto nos cinco anos em que foi professor em Marburgo (recusou uma proposta para Berlim), cedo se tornou um dos filósofos mais conhecidos e influentes, influência essa que se estendeu mesmo à moderna teologia de Karl Rahner ou Rudolf K. Bultman. Sua disponibilidade para colaborar com o regime nazista, após a tomada de poder por Hitler, em 1933, aceitando o lugar de reitor em substituição a outro vetado pelos nazistas, abalou seu prestígio. Também contribuiu para isso o fato de equiparar o "serviço do saber" na escola superior ao serviço militar e funcional. Em1946, as autoridades francesas de ocupação retiraram-lhe a docência, que lhe foi restituída em 1951. Outras importantes obras suas são Introdução àMetafísica, 1953, Que Significa Pensar?, 1964, e Fenomenologia e Teologia, 1970. A obra completa de Heidegger foi editada na Alemanha em 70 volumes.
Dasein
Ainda assim, até ao final da década de trinta, a leitura da filosofia de Heidegger estrutura-se sobre conceitos como Dasein (o ser-aí ou o ser-no-mundo), morte,angústia ou decisão. Como entroncamento central de toda a sua fenomenologia encontra-se o conceito de Jeweiligkeit: ser-a-cada-momento ou de-cada-vez (Respectividade). Esta noção é fundamental para se compreender a de Dasein, que não deve ser sem mais vertida para Ser humano, homem, nem mesmo para Realidade Humana (ver, a este respeito, A Carta sobre o Humanismo- para mais pormenores sobre a difícil tarefa da tradução do termo veja-se o artigo correspondente, Dasein).
O horizonte de fundo de toda a sua investigação é o do sentido de Ser, os modos e as maneiras de enunciação e expressão de ser. Nesta medida o importante está em alcançar a colocação correcta da questão pelo sentido de ser. Assim, ele põe a claro a desvirtuação dessa investigação ao longo da tradição que sempre se prendeu a uma compreensão ôntica, dominada pelo ente, em vez de se dedicar adequadamente ao estudo do ser. Esta notificação deve indicar-nos que não apenas o ente é, mas que o ser tem modos: há modos de ser. E cada ente deve ser abordado a partir do modo adequado de o abordar, o que deve ser esclarecido a partir do modo de ser próprio do ente que em cada caso está em estudo.
O Dasein, pela sua especificidade, inicia qualquer interrogação. O Dasein é o ente que em cada caso propriamente questiona e investiga. É também o Dasein que detém a possibilidade de enunciar o ser, pois é ele que tem o poder da proposição em geral. Daí que na questão acerca do sentido de ser seja fundamental começar por abordar o ser deste ente particular. E tem que ser o próprio Dasein a fazer isso, tem que ser ele próprio a mostrá-lo, a partir duma análise fenomenológica esclarecida (hermenêutica).
Neokantismo
Algumas obras de Heidegger revestem-se de inspiração kantiana, quer pelo método crítico que os rege, quer pelos seus resultados, quer pela escolha dos temas. Regra geral considera-se que as obras anteriores a Ser e Tempo são de teor kantiano. Esta fase do seu pensamento constitui para alguns estudiosos o primeiro momento da sua filosofia, marcado pela influência de Kant e pela pujança fenomenológica. Apesar das reservas dos seguidores da sua metodologia, Heidegger tende a ser aproximado ao movimento existencialista. Esta fase é aquela que mais facilmente se relaciona com este movimento.
A tese de doutoramento sobre A teoria do juízo no psicologismo (1913), a tese de docência acerca d'A doutrina das categorias e do significado em Duns Escoto(1916) e o tratado A História do Conceito de Tempo, também conhecido como Conceito de Tempo em Historiografia (1914), são consensualmente aceites como (neo)kantianas. Estas obras, dentro de uma terminologia e temática próprias do Neokantismo, abordam problemas que o extravazam e já não podem ser resolvidas nas estritas fronteiras kantianas.
A facticidade da existência, que viria a fazer parte da terminologia de Ser e Tempo, torna impraticável a posição de um sujeito do conhecimento como sujeito puro que se supõe na reflexão de tipo transcendental. A consciência implica uma temporalidade irredutível ao tempo físico, estritamente métrico ou cronológico. Esta temática torna-se o cerne da sua lição inaugural, na Faculdade de Teologia da Universidade de Marburgo, A História do Conceito de Tempo.
Escritos de Husserl
Nos escritos de Husserl, na formulação conhecida até 1920, Heidegger podia encontrar já uma novidade radical relativamente ao Neokantismo. Este privilegiava a ciência e aspirava para a Filosofia uma linguagem igualmente rígida e estrita. Para Husserl, o acto de cognição resolvia-se na intuição eidética (Anschauung). O acto cognitivo não podia assim ser limitado ao conhecimento científico, pois trata-se dum encontrar as coisas.
O ir às coisas elas mesmas husserliano ficou conhecido para sempre: trata-se dum encontro com as coisas em carne e osso. Esta concepção já não entende o fenómeno em oposição à coisa em si ou ao númeno, mas como manifestação positiva da própria essência da coisa, por assim dizer (veja-se a este respeito H. G. Gadamer, Die phänomenologische Bewegung em Philosophisce Rundschau 1963, pp. 19-20). Esta posição saía da matriz neokantiana e dos limites dotranscendentalismo.
Fenomenologia
Heidegger encontra na fenomenologia, na forma que tinha à época, nas obras de Husserl até então publicadas, um mundo em pleno desenvolvimento. Husserl afirmava que "a Fenomenologia somos eu e Heidegger".
A Fenomenologia recebe assim influência de Heidegger que lhe inculca alguns dos seus problemas e temas centrais, tais como a Lebenswelt. A influência é, portanto, mútua. Nesta altura Heidegger recebe também vigorosas influências provenientes da segunda edição de Kierkegaard e de Dostoievski, ao mesmo tempo que vê surgir o interesse por Hegel e Schelling por todo o meio académico alemão. As poesias de Rilke e de Trakl são outras fontes de inspiração. Nietzsche, influência e preocupação maior dos anos que vão de 1935 a 1943, está ainda, entre 1910 e 1916, longe do seu pensamento.
A esta altura Heidegger encontra-se principalmente ocupado na interpretação de Dilthey e Kierkegaard.
Kierkegaard
Para Heidegger, para os heideggereanos e, de facto, para a maior parte dos existencialistas, Kierkegaard é um pensador que enunciou explicitamente o problema da existência. Contudo, Heidegger considera que a colocação do problema não remanesceu existencialmente, mas que, pelo contrário, permaneceu geralmente a um nível existenciário ou ôntico.
A formação do pensamento que levaria ao Ser e Tempo encontraria ainda contributos de São Paulo, de Lutero e de Calvino. No semestre de Inverno do ano escolar de 1919-1920, Heidegger profere um dissertação em jeito de discurso sobre os Fundamentos da mística medieval e, no ano seguinte, um deIntrodução à fenomenologia da religião.
No semestre de verão de 1921 surge um discurso intitulado S. Agostinho e o neoplatonismo. Isto numa época em que as suas preocupações estão centradas na problemática da temporalidade com o estudo de Kierkegaard a fornecer-lhe novos horizontes, e Heidegger traçava novos planos teóricos rasgando com o esquema da ontologia clássica que o próprio Kierkegaard havia deixado intacto, bem como com a estrutura metafísica helénica preservada pelo neoplatonismoe adaptada por Aurélio Agostinho.
O pensamento de Heidegger e a psicoterapia
Em 1947, Heidegger respondeu pessoalmente a uma carta enviada pelo psiquiatra suíço Medard Boss pedindo esclarecimentos sobre suas ideias filosóficas.
Iniciaram um processo de troca de correspondência e visitas que se prolongou por doze anos e frutificou na iniciativa de Boss em promover a realização de uma série de encontros com a participação aberta para alunos e colegas psiquiatras, os Seminários de Zollikon, realizados entre 1959 e 1969.
Considerados fundamentais na concepção e conceituação da Daseinsanalyse, nestes seminários discutiram as possibilidades de integração da ontologia e dafenomenologia de Heidegger à teoria e práxis da medicina, psicologia, psiquiatria e psicoterapia.
Os protocolos destes seminários e as correspondências trocadas por Heidegger e Boss foram publicados na Alemanha em 1987.
Heidegger também contribuiu e participou da edição da obra de Boss "Existential Foundations of Medicine and Psychology", publicada em 1979, texto que advoga uma fundamentação existencial para a medicina e para a psicologia.
Foi um filósofo e teólogo dinamarquês. Kierkegaard criticava fortemente quer o hegelianismo do seu tempo quer o que ele via como as formalidades vazias da Igreja da Dinamarca. Grande parte da sua obra versa sobre as questões de como cada pessoa deve viver, focando sobre a prioridade da realidade humana concreta em relação ao pensamento abstracto, dando ênfase à importância da escolha e compromisso pessoal.1 A sua obra teológica incide sobre a ética cristã e as instituições da Igreja.2 A sua obra na vertente psicológica explora as emoções e sentimentos dos indivíduos quando confrontados com as escolhas que a vida oferece.3 Como parte do seu método filosófico, inspirado por Sócrates e pelos diálogos socráticos, a obra inicial de Kierkegaard foi escrita sob vários pseudónimos que apresentam cada um deles os seus pontos de vista distintivos e que interagem uns com os outros em complexos diálogos.4 Ele atribui pseudónimos para explorar pontos de vista particulares em profundidade, que em alguns casos chegam a ocupar vários livros, e Kierkegaard, ou outro pseudónimo, critica essas posições. A tarefa da descoberta do significado das suas obras é pois deixada ao leitor, porque "a tarefa deve ser tornada difícil, visto que apenas a dificuldade inspira os nobres de espírito"5 Subsequentemente, os académicos têm interpretado Kierkegaard de maneiras variadas, entre outras como existencialista, neo-ortodoxo, pós-modernista,humanista e individualista. Cruzando as fronteiras da filosofia, teologia, psicologia e literatura, tornou-se uma figura de grande influência para o pensamento contemporâneo.6 7 8 Está sepultado no Cemitério Assistens.
Filosoficamente, fez a ponte entre a filosofia hegeliana e aquilo que se tornaria no existencialismo. Kierkegaard rejeitou a filosofia hegeliana do seu tempo e aquilo que ele viu como o formalismo vácuo da igreja luterana dinamarquesa. Muitas das suas obras lidam com problemas religiosos tais como a natureza da fé, a instituição da fé cristã, e ética cristã e teologia. Por causa disto, a obra de Kierkegaard é, algumas vezes, caracterizada como existencialismo cristão, em oposição ao existencialismo de Jean-Paul Sartre ou ao proto-existencialismo de Friedrich Nietzsche, ambos derivados de uma forte base ateística.
A obra de Kierkegaard é de difícil interpretação, uma vez que ele escreveu a maioria das suas obras sob vários pseudónimos, e muitas vezes esses pseudo-autores comentam os trabalhos de pseudo-autores anteriores.
Kierkegaard é um dos poucos autores cuja vida exerceu profunda influência no desenvolvimento da obra. As inquietações e angústias que o acompanharam estão expressas em seus textos, incluindo a relação de angústia e sofrimento que ele manteve com o cristianismo — herança de um pai extremamente religioso, que cultivava de maneira exacerbada os rígidos princípios doprotestantismo dinamarquês, religião de Estado.
Kierkegaard está associado à ideia de que a religião é, no seu fundamental, não uma persuasão da verdade de uma doutrina, mas sim a dedicação a uma posição que é inerentemente absurda, ou que dá "ofensa", o termo usado por Kierkegaard. Para Kierkegaard, nós obtemos a nossa identidade ao acreditar em algo que ofenda profundamente a nossa mente, o que não é uma tarefa fácil. Para existir, teríamos de acreditar e acreditar em algo que seja ominosamente difícil de acreditar. Esta é a essência do processo existencialista em Kierkegaard, que associa a fé com a identidade.
Marcuse, Herbert (1898 -1979)
Sua obra Razão e Revolução, escrita em 1941, foi uma importante contribuição para a compreensão de Hegel e sua influência sobre Marx. Um Hegeliano-freudiano-marxista, Marcuse destacou as formas de repressão cultural, bem como o papel da tecnologia e a expansão da produção de bens de consumo na manutenção da estabilidade do capitalismo. Marcuse observou que a prosperidade do pós-guerra tinha conseguido manter as massas intelectual e espiritualmente em cativeiro e suas obras posteriores são permeadas com pessimismo. Embora um crítico aberto da ordem estabelecida, Marcuse não aplaudiu as manifestações dos estudantes em 1968. Entre suas principais obras estão Razão e Revolução (1941) e Eros e Civilização (1955).
O contato com o jovem Marx
Todos os filósofos que participaram até então da formação de Marcuse tiveram sua importância grandemente diminuídas quando são editadas as obras da juventude de Karl Marx em 1932. Marcuse foi um dos primeiros a interpretar críticamente os Manuscritos Economico-filosóficos de Marx e "pensava encontrar neles um fundamento filosófico da economia política no sentido de uma teoria da revolução" (Wiggershaus 2003:134). Para ele, não era mais necessário recorrer a Heidegger para fundamentar filosoficamente o marxismo, já que viu no próprio Marx a possibilidade desta fundamentação.
É de Marx que virá sua crítica ao Nacionalismo e aos efeitos que o capitalismo burguês vai ter na vida das pessoas. Também vem de Marx a proposta de que, com o desenvolvimento da tecnologia e do capitalismo como um todo, em conjunto com uma ação prática-revolucionária da sociedade, poderemos alterar as nossas condições e erguer uma nova organização social, que possibilite uma vida melhor para as pessoas, e onde elas não sejam alienadas. Marcuse procura esboçar caminhos que nos levem para além da organização sócio-econômica atual.
O contato com a Escola de Frankfurt
Em 1933, por intermédio da intervenção de Leo Lowenthal e de Kurt Riezler, Herbert Marcuse foi admitido no Instituto de Pesquisas Sociais que seria mais tarde associado à Escola de Frankfurt, que neste momento estava exilado em Genebra. Ele tentara, sem sucesso, desde 1931 entrar em uma relação mais estreita com o Instituto. Em 1934, junto com Theodor Adorno e Max Horkheimer mantém suas atividades nos Estados Unidos. Em 1950 os colaboradores do Instituto retornam à Alemanha, Marcuse decide permanecer nos Estados Unidos onde pensa, escreve e ensina até sua morte em 1979.
Diálogo com a a obra Freudiana
Podemos perceber, em “Eros e Civilização”, um diálogo constante que Marcuse terá com a obra Freudiana. Uma grande influência de Freud será a busca da felicidade do indivíduo humano, que virá através da satisfação dos desejos individuais da pessoa. As pessoas hoje seriam infelizes porque a sociedade bloqueia a realização de seus desejos, e devemos tentar reverter essa situação. Será utilizado muito da teoria da psicanálise, também, para explicar o comportamento das pessoas na sociedade atual; por exemplo, como atuam suas pulsões e como procuram realizar ou reprimir os seus desejos. 3
De acordo com o prefácio de "Eros e Civilização", essa sua obra tinha um objetivo otimista: de que as mudanças decorridas nos últimos tempos de nossa sociedade industrial-tecnológica nos habilitariam a inverter o sentido do progresso. Ao invés de se basear em uma sociedade de produção e consumo desenfreados, poder-se-ia usar a riqueza e o conhecimento da sociedade de forma a satisfazer, na medida do possível, as pulsões vitais humanas, além de impedir os efeitos nocivos de nossas vontades destrutivas. O homem poderia então trabalhar menos e se dedicar mais a uma vida de satisfação de seus desejos e pulsões, vivendo de maneira muito mais plena. No entanto, Herbert reconhece que subestimou a capacidade do sistema sócio-político atual em desenvolver formas de controle social cada vez mais eficazes. Entre essas formas de controle, temos uma produção de bens supérfluos cada vez maior, para redirecionar as necessidades de prazer e satisfação da população.
Suas idéias
Marcuse se preocupava com o desenvolvimento descontrolado da tecnologia, o racionalismo dominante nas sociedades modernas, os movimentos repressivos das liberdades individuais, o aniquilamento da Razão . Para os membros do grupo de Frankfurt, o proletariado se perdeu ao permitir o surgimento de sistemas totalitário como o nazismo e o stalinismo por um lado, e a "indústria cultural" dos países capitalistas pelo outro lado. Quem substitui os proletários? Aqueles cuja ascensão a sociedade moderna de modo algum permite, os miseráveis que o bem-estar geral não conseguiu incorporar, as minorias raciais, os outsiders.1
Marcuse retoma de Hegel duas noções capitais, a idéia de "Razão" e a idéia de "Negatividade". A Razão é a faculdade humana que se manifesta no uso completo feito pelo homem de suas possibilidades. Não se pode compreender a "possibilidade" longe do conceito de "necessidade". O que necessitamos? A necessidade nos dirige a certos objetos cuja falta sentimos. A possibilidade mede o raio de nosso alcance face a tais objetos. Se quero um apartamento mas não tenho dinheiro para comprá-lo, o objeto de minha necessidade é o apartamento, e a medida de minha possibilidade é o dinheiro que me falta. É muito fácil compreender como a falta de dinheiro representa um bloqueio falso, fictício, á satisfação de meu desejo. Na realidade posso ter o apartamento, mas certas convenções sociais, que respeito de modo mais ou menos acrítico, me impedem de possuí-lo. Ao mesmo tempo, se me interrogo a respeito da minha necessidade face ao apartamento, essa também se dissolve. O apartamento é um símbolo de status social, ou resultado de certas convenções visando ao gosto que seriam, em outras condições, muito discutíveis, e que nem sempre me possibilitam morar satisfatoriamente. A minha necessidade se revela, portanto, como uma falsa necessidade, assim como o bloqueio pela falta de dinheiro das minhas possibilidades era um bloqueio falso. Onde se encontram, então, minhas necessidades e minhas possibilidades? Como compreenderemos o que e Razão? Marcuse muito se preocupa com este problema ao longo de toda a sua obra, sempre polêmica.
No livro Ideologia da Sociedade Industrial, Marcuse repete a crítica ao racionalismo da sociedade moderna, e tenta ao mesmo tempo esboçar o caminho que poderá nos afastar dele. O caminho será, por um aspecto, a contestação da sociedade pelos marginais que a sociedade desprezou ou não conseguiu beneficiar. Será por outro aspecto o desenvolvimento extremo da tecnologia, que deverá ter, segundo Marx e Marcuse, efeitos revolucionários. Quais são estes efeitos? O problema da sociedade moderna é a invasão da mentalidade mercantilista e quantificadora a todos os domínios do pensamento. Essa mentalidade se representa economicamente pelo valor de troca, ligado de modo íntimo aos processos de alienação do homem. E, segundo Marx, com o desenvolvimento extremo da tecnologia "a forma de produção assente no valor de troca sucumbirá". A sociedade moderna, sentindo, que sua base a tecnologia - contém seu rompimento, age repressivamente para evitar este avanço extremo. Marcuse tinha esperança de que não.
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